sexta-feira, 4 de agosto de 2017

A cultura em RR vive em um limbo, declara ex-presidente do Conselho de Cultura

Esta é a primeira de uma série de entrevistas sobre políticas públicas de cultura. Bateremos um papo bacana com gente mais bacana ainda que tem muito a dizer sobre o assunto, pela formação na área ou pela experiência de vida. Doido é quem fecha os ouvidos para esse povo!

Foto: acervo pessoal
Com vocês, nosso primeiro bate-papo:

Silmara Costa é um espetáculo: dos palcos, a atriz de teatro foi às ruas, onde o povo está. Nesse percurso, atuou em importantes momentos da história da militância cultural de Roraima: ajudou a criar instituições e coletivos como o Fórum Permanente de Cultura de Roraima, a Federação de Teatro de Roraima e o coletivo Reagentes Culturais, além de ter sido presidente do Conselho Estadual de Cultura.

Nesta conversa, deixa claros seus firmes posicionamentos: para a militante, faltam servidores “capacitados” nas pastas governamentais de cultura no Estado. Além disso, avalia que a cultura em Roraima vive em um “limbo”, um modelo “arcaico”, que “desrespeita o artista e privilegia a cultura de balcão”.

Silmara Costa defende a revisão, mediante consulta popular ampla e democrática, da Lei de Incentivo à Cultura e das leis estaduais do Conselho e do Fundo de Cultura. Apoia ainda a eleição direta de representantes da sociedade civil para o Conselho Estadual de Cultura e a contratação de pareceristas externos no processo de seleção pública de projetos culturais: “Efetivar as políticas culturais que estão no papel é urgente!”

Você acredita que fazer arte é uma forma de fazer política?
Certamente, ser artista não é nada fácil. Estamos em constante processo de luta por direitos. O teatro no Brasil e no mundo sempre teve uma importância muito grande no campo da política, desde suas críticas e sátiras como forma de denúncia, até na forma de luta por direitos. 2015 foi um ano de muito embate no campo da política cultural no Brasil. Vivemos um período de desmonte do Ministério da Cultura (MinC) e, por efeito, isso tem acontecido nos Estados e municípios. Vários grupos de teatro estiveram à frente de um momento histórico de resistência, que foi o Ocupa MinC. As ocupações ocorreram em todo País, nos 27 Estados e em pelo menos 30 cidades. Algo nunca ocorrido até então.

Uma crítica histórica aos conselhos de cultura inoperantes pelo Brasil é que de alguns seriam conselhos de notáveis. Que medidas poderiam ser tomadas, especialmente na realidade de Roraima, para que, independentemente do gestor, o Conselho Estadual de Cultura possa ter uma boa atuação?
Primeiro, a legislação precisa ser revista e passar por consulta pública. O modelo existente é antigo e abre brechas para indicações de notáveis. No entanto, esse processo é mais lento. Já tivemos avanços com as eleições diretas em que a sociedade civil elege seus pares e não há indicação da listra tríplice, a partir da qual o governador escolhe quem será o conselheiro. A sociedade civil pode e deve participar das comissões criadas para o acompanhamento das eleições, inclusive do processo de formulação de edital de eleição.

Como aperfeiçoar continuamente a Governança e o processo de políticas públicas de cultura cada vez mais participativo, democrático e que atenda aos anseios e necessidades dos cidadãos?
É preciso abrir espaços de diálogo com os segmentos, aproximar os artistas e a sociedade dos debates realizados pela Secult e pela Fetec, ouvir de fato os artistas em um debate qualificado. Vivemos um momento em que “temos que engolir" o que nos é empurrado. Faltam pessoas capacitadas dentro da pasta da cultura. A cultura está para além da mercadoria. E as secretarias e órgãos têm em seu corpo pessoas que estão para ocupar cargos, apenas. A cultura, como em qualquer setor, precisa de profissionais que compreendam o que estão fazendo e tenham a consciência da responsabilidade de estar ali.

Como você avalia a importância e a necessidade da inclusão da figura dos pareceristas nos processos de seleção de projetos culturais para financiamento com recursos públicos?
Fundamental, por criar segurança e transparência no processo das análises, na tentativa de evitar vícios e favorecimentos, além de atender à necessidade de especialistas capacitados para cada área.

Na sua opinião, que políticas públicas de cultura de outros Estados poderiam ser adaptadas com sucesso à realidade de Roraima?
Sinceramente, se a gente, ao menos, conseguir colocar em funcionamento as políticas pensadas para o Estado já sairemos desse limbo em que vive a cultura hoje: ainda vivemos um modelo arcaico, que desrespeita o artista e privilegia a cultura de balcão. Efetivar as políticas culturais que estão no papel é urgente!

Como o mecanismo da Lei Estadual de Incentivo à Cultura poderia ser aperfeiçoado?
A legislação é antiga e já merece uma revisão. Muitas coisas já não cabem. E principalmente a forma de financiamento carece, com urgência, de modificações com um amplo debate. O número de projetos que deixam de ser captados tem muita relação com isso.

Como o mecanismo do Fundo Estadual de Cultura poderia ser aperfeiçoado?
Primeiro, a gestão precisa implementar o fundo e efetivar seu funcionamento, coisa que ainda não aconteceu. E, de fato, ouvir as demandas da sociedade. 

Então, tá! Até o próximo bate-papo!

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